terça-feira, 27 de março de 2018

Vivendo como Igreja relacional 02

VIVENDO COMO IGREJA RELACIONAL
Escrito por Wayne Jacobsen. Traduzido por Ezequiel Netto
02 - Setembro de 1999.
 Não deixemos de reunir-nos como igreja, segundo o costume de alguns, mas encorajemo-nos uns aos outros, ainda mais quando vocês veem que se aproxima o dia” (Hb 10:25).
Não conheço outra Escritura que tenha sofrido mais abuso que esta. É muitas vezes citada como a razão pela qual as pessoas devem participar de uma instituição religiosa nas manhãs de domingo, sentar nas fileiras e submeterem-se à performance musical e leitura que outras prepararam para elas.
Para muitos, este é o único critério que determina se alguém pertence à igreja de Deus ou se é relacionado como independente e rebelde. É uma ideia tão cristalizada em nossa psique religiosa que nada mais importa.
Se você frequenta algum desses estabelecimentos religiosos com certa regularidade (poucas semanas já são suficientes), os demais te considerarão um crente saudável. Se não, eles levantam as sobrancelhas com desconfiança. Só o frequentar já valida a fé de alguém, mesmo quando mais nada em suas vidas é considerado para mostrar que conhecem a pessoa de fato. Algumas das pessoas mais arrogantes e independentes que conheço participam semanalmente de eventos religiosos, mas saem e vivem a vida em seus próprios termos.
Baseado neste ponto, muitos vão admitir que frequentar cultos nas manhãs de domingo não vai garantir seu caminho para os céus e nem assegurar um relacionamento transformador com o Deus Vivo. Enquanto eles admitem que isso pode não funcionar para todo mundo, consideram aqueles que não congregam regularmente como estando em grande perigo.
Que tragédia! Quando falhamos em enxergar a igreja como Deus a vê, e impensavelmente abraçamos o que 2000 anos de tradição religiosa diz que ela é, perdemos uma das mais simples e melhores verdades da Palavra de Deus. O escritor de Hebreus está falando de algo muito mais vital do que alguém sentado nos bancos num culto de domingo.
Encorajando uns aos outros.
O texto de Hebreus acima nunca foi escrito para ser uma comprovação para obrigar as pessoas a frequentarem uma programação de cultos toda semana. Mas, por favor, não me compreenda mal. Se seu relacionamento com outros cristãos gira em torno destas reuniões e neste ambiente você está crescendo em experimentar tudo o que Deus tem pra você, permaneça com isso!
Mas penso que cometemos um erro grave se assumirmos que isso era tudo o que o escritor tinha em mente. Eu apresento cinco razões pelas quais ele deveria estar falando de algo maior:
Primeiro, a igreja daquela época não tinha nada parecido com o que atualmente chamamos de “culto”. Sim, eles se reuniam - principalmente em casas, e só ocasionalmente em reuniões maiores para ouvir um dos apóstolos ou um mestre distante que os ajudaria a descobrir quem Deus é e como caminhar com Ele. Essas reuniões, contudo, em nada se pareciam com a maioria das reuniões atuais, feitas mais para entreter do que para capacitar.
Segundo, o escritor tinha o foco em um ambiente onde cada crente era envolvido em encorajar os outros - estimulando-os ao amor e boas obras. Onde isso acontece nas reuniões atuais? As pessoas só olham para a nuca das outras enquanto todo o “ministério” é desempenhado por talentosos músicos e oradores. Essa Escritura pinta um quadro totalmente diferente, com diálogo face a face e engajamento pessoal.
Terceiro, ele fala para eles fazerem isso diariamente. Como isto poderia ser compreendido como uma ou duas reuniões semanais? O escritor estava falando de reuniões que eles teriam a cada dia. Obviamente, ele não falava de reuniões organizadas, mas contatos espontâneos entre crentes que aprendiam a viver juntos diante de Deus e encontravam ocasiões para compartilhar suas vidas diariamente.
Quarto, ele diz especificamente que a principal razão em se reunir é para que um encorajasse ao outro. A maioria das pessoas fala em frequentar as instituições religiosas de hoje por causa da responsabilidade que assumiram, e não para encorajamento. O que pode ser doloroso, mesmo não sendo intencional. Philip Yancey conta sobre uma prostituta que buscava ajuda e foi encorajada a procurar uma igreja. Ela respondeu, “Por que eu iria lá, pois já me sinto terrível comigo mesmo. Eles farão eu me sentir pior”.
Surpreendentemente, nenhuma Escritura orienta os crentes ou líderes a dar responsabilidades a cada um. Isto é reservado somente a Deus. Estamos falando de encorajar uns aos outros e dizendo que algumas vezes poderíamos confrontar ou admoestar, e isso não quer dizer que estamos assumindo responsabilidade uns pelos outros.
Quinto, ele animou os crentes a se conectarem uns com os outros em toda a comunidade. Enquanto pregamos que a reunião dos crentes é essencial, nossas reuniões contribuem cada vez mais para a fragmentação do corpo de Cristo em cada localidade. Em vez de nos ligarmos com uma grande diversidade de pessoas, nos reunimos apenas com pessoas exatamente iguais a nós, e que creem da mesma forma que nós.
Dois ou três reunidos.
O escritor de Hebreus encorajava um relacionamento entre os crentes que ia muito mais fundo que qualquer culto religioso pode oferecer. Ele falava de uma completa rede de relacionamentos que Deus constrói entre os crentes e o quanto é importante para nós permitir que outras pessoas participem de nossas vidas. Não caminhe sozinho, quando podemos ser tão úteis uns para os outros.
Paulo nos deu uma percepção do porquê disso em Efésios. Ele disse que a plenitude de Deus é revelada em todo o corpo, e não em crentes isolados. Não conhecemos o bastante por nós mesmos, e nem teremos força suficiente. E como vamos vivenciar isso? Sendo espectador em uma grande reunião, ou compartilhando nossas vidas com companheiros de caminhada?
Até mesmo Jesus deixou isso claro ao dizer que o mais poderoso momento da vida do corpo acontece entre dois ou três, e não em grupos de centenas. É onde as pessoas podem ser conhecidas pelo que realmente são, amadas em momentos de desespero, e descobrir a presença de Deus nos outros.
O mais poderoso exemplo disso neste século aconteceu na China durante o regime comunista. Como as pessoas foram forçadas para a clandestinidade por causa da perseguição, eles descobriram a alegria de cuidarem uns dos outros, de não se considerarem como a pessoa mais importante, a liberdade das tradições religiosas, da liderança de um só homem, e daqueles que não eram completamente rendidos a Deus. Como a vida de Deus cresceu no meio deles é que foi o mais interessante. E nós estamos ouvindo as mesmas lições que eles aprenderam neste período? Não! Estamos tão ocupados com nossa programação cristã de forma que elas possam ser mais parecidas como nosso jeito.
As circunstâncias os forçaram a abraçar o que o Novo Testamento fala tão claramente. A verdadeira vida do corpo não pode ser adotada institucionalmente; ela resulta de pessoas completamente apaixonadas pelo Pai e aprendendo como viver como família com outros irmãos e irmãs.
Infelizmente, muitos crentes nunca experimentaram este tipo de vida no corpo - não têm uma visão de igreja além do que experimentam nos domingos, assistem ao culto e voltam para suas vidas particulares. Contudo, quando vem a crise e precisam de amigos para compartilhar a vida de Deus nessas circunstâncias, não encontram ninguém. Logo percebem que ficar sentados assistindo cultos não os prepara adequadamente para encarar os dias ruins de suas vidas.
Encontrando a Família.
Conhecendo a Deus como Pai nos leva a um engajamento com seu povo como família. Você sente a fome agitando você? Está acontecendo com pessoas em todo o mundo! Cansados com os joguinhos políticos usados para manipular o poder institucional, ou entediados com o ambiente passivo promovido nos “cultos” de adoração, pessoas estão deixando a religião organizada em números cada vez maiores.
Conheço muitos destes que, infelizmente, abandonaram a Deus, mas também muitos outros famintos em compartilhar uma autêntica vida no corpo de Cristo com outros crentes que permitem que Jesus seja verdadeiramente o centro da forma que aprendemos a viver sua vida em completa liberdade. Como muitos no limite da fome, eles podem não saber o que estão realmente buscando. Como muitos de nós ficamos a maior parte de nossas vidas numa religião, não temos certeza de onde mais devemos olhar. Então continuamos buscando um evento, um grupo de pessoas ou um mentor para nos ajudar encontrar um caminho, e muitas vezes ficamos desapontados nessa busca.
Como disse no último artigo, a dinâmica institucional só produzirá uma sombra do que a vida familiar realmente é. Ela não pode nos proporcionar a realidade. Se é relacionamento o que estamos querendo, então devemos pensar relacionalmente. O tipo de comunidade de Deus não é produzido pela engenhosidade humana ou por um programa. Ela brota organicamente em torno das pessoas que estão aprendendo a seguir Jesus e se veem como parte de algo maior que eles mesmos.
Então, encontrando a família do Pai começa com o próprio Pai, e não com os outros. Se Ele não é o objeto de sua busca de todo o coração, você perderá a parte principal do que Ele é pra você. Não comece com um programa. Comece com Ele. Não permita que nenhuma expressão da vida do corpo seja substituto para o cultivar de seu relacionamento pessoal com Ele. Muitas vezes confundimos isso. Buscamos um relacionamento com Deus no relacionamento com os outros. O oposto, porém, é verdadeiro. Aprendemos a nos relacionar com os outros, mas amando a Deus em primeiro lugar. Então você será capaz de ver como Ele está te colocando em família ao redor de você. Se volte para toda a sua localidade, e não apenas para um grupo particular. Deus tem pessoas em todo lugar. Descobrir como Ele quer te introduzir nesse processo pode envolver alguns estágios, tais como:
1. Comunhão Espontânea: estar conectado na família muitas vezes começa com comunhão espontânea. Que crentes famintos Deus colocou ao seu redor? Podem ser pessoas conhecidas que você convidaria para uma tarde de comunhão, ou almoçar de vez em quando. Também acontece em momentos não programados, quando você está na fila do mercado e encontra uma pessoa à sua frente que também ama ao Senhor.
Deus tem muitas maneiras de reunir sua família. Procure conhecer a família que mora em seu bairro; convide à sua casa o novo funcionário de seu trabalho, ou seja voluntário em sua comunidade e veja quem Deus colocou perto de você. Te garanto que não vai mais olhar as pessoas ao seu redor da mesma forma novamente. Eles podem ser crentes com os quais você pode compartilhar a vida de Deus, ou pessoas que não o conhecem plenamente, às quais você pode amar em nome de Jesus.
A comunhão começa dessa maneira. Pessoas que conhecem um pouco mais umas das outras, e descobrem que têm a vida de Deus em comum. Em minhas viagens encontro pessoas em todo canto do mundo com fome de conhecer o Deus Vivo, que tomamos uma refeição juntas, ou que nos encontramos na casa de alguém que eu ainda não conhecia, onde começa um longo relacionamento onde compartilhamos nossa paixão por Jesus.
A comunhão espontânea pode der bastante fluida. Ela pode durar somente poucos momentos, ou dias, mas algumas vezes ela pode se tornar muito mais significativa. Olhe ao redor de você. Os crentes com os quais Deus quer que você experimente a vida do corpo podem estar muito mais perto do que você pensa.
2. Desenvolvendo amizades: além desses encontros espontâneos, você encontrará pessoas com as quais você deve ter conexões mais profundas. Isto se o Espírito Santo está aproximando vocês para ajuda mútua na caminhada.
As amizades se desenvolvem quando as pessoas se esforçam para estar juntas. Encontram-se constantemente, procuram coisas para fazerem juntos, e retornam encorajados após esses encontros.
Amigos não colocam expectativas uns sobre os outros, e nem usam o outro para suas necessidades pessoais. Amigos são aqueles que compartilham juntos suas jornadas com o Pai. Não buscam controlar um ao outro, e nem desprezam o outro caso não atenda suas necessidades. A amizade divina busca compartilhar a caminhada juntos com a mais profunda honestidade e vulnerabilidade, sempre dando a liberdade para a outra pessoa ser completamente genuína.
Muitas vezes a amizade surge entre pessoas que se ajudaram durante tempos difíceis. O que muitas vezes começa como um ato de compaixão pode facilmente se tornar uma amizade muito próxima. Por isso é importante engajar pessoas em necessidade ao redor de nós, oferecendo suporte e a ajuda necessária que pudermos até que atravesse a crise.
Toda amizade verdadeira que temos com alguém na família do Pai é um incrível tesouro. Elas são dignas de cada fração de tempo que gastamos para cultivá-las. As verdadeiras duram para sempre, embora o tempo e as circunstâncias podem não permitir que estejamos juntos com regularidade. Mas quando vocês se reencontram, podem retomar exatamente do ponto onde pararam.
3. Comunidade Intencional: com o desenvolvimento das amizades, muitas vezes as pessoas querem algo mais. Deus nos fez para viver em comunidade, lembre-se disso, e embora estejamos ligados pela cruz a todos os crentes do planeta, uma das mais valiosas formas de experimentar a vida de Cristo é compartilhar a caminhada com um grupo de amigos.
A comunidade intencional acontece quando um indivíduo ou família decide se ligar com outros para compartilhar a caminhada. Percebendo que o Pai os chamou para caminhar juntos por um tempo, que pode durar alguns meses ou vários anos, eles escolheram compartilhar suas experiências juntos, seja em reuniões regulares de compartilhamento, louvor, oração e estudo da Palavra, e tendo contato durante a semana.
Ouvindo a Deus juntos, guardando a liberdade de cada um em Cristo, cuidando uns dos outros em momentos de necessidade, e estando atentos para como Deus quer nos usar para estender seu reino parecem ser alguns dos objetivos deste tipo de comunidade.
A forma que elas tomam, contudo, pode variar bastante. Igrejas nos lares podem ser do jeito que falei, mas também podem ser grupos que surgem dentro das instituições. Eles não se reúnem por uma aliança ou credo, mas por pessoas que escolhem se amar profundamente o bastante para estarem juntas nos altos e baixos da vida, e viverem abertamente umas para as outras. Embora isto possa demandar um artigo inteiro algum dia, as crianças se adaptam muito bem a esse ambiente e nada melhor do que isso para prepará-las a uma vida de aventura na família do Pai.
A Iniciativa Necessária.
Por que, muitas vezes, esses grupos são difíceis de encontrar? Porque eles exigem um nível de iniciativa pessoal que a maioria das estruturas programadas roubou do povo de Deus. Pode ser porque alguns preferem ser alimentados como crianças, ou porque foram levados a pensar que são incompetentes para seguir a Deus sem a ajuda de um líder “ordenado”, muitos crentes têm pouco tempo ou energia para descobrir a grandeza de viver no corpo de Cristo do jeito que o Pai pretende.
Existem maneiras muito mais fáceis de juntar cristãos, mas para descobrir a profundidade do que viver na família do Pai quer dizer não podemos simplesmente sentar atrás de alguém e esperar que façam a programação. Em vez disso, podemos optar por nos unir com pessoas que Deus colocou ao nosso redor buscando de que forma nossas vidas podem abençoar a outros. Reconhecendo as pessoas que Deus chamou para andar conosco, podemos combinar nossos recursos com aqueles irmãos e irmãs e nos descobrir muito mais capacitados a estar firmes quando os dias forem maus.
Isto é o que o escritor de Hebreus quis que você soubesse.
Isto é o que Deus está reedificando nestes dias. Peça para Ele te mostrar sua igreja como Ele mesmo a vê, e viver na alegria, poder e liberdade desta realidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário